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Exposição de Arte e Ciência

Data

20 Janeiro - 18 Fevereiro 2024

Local

Laboratório de Química Analítica | Museu

Exposição da artista plástica Saskia Moro
 
O Laboratório contentor de palavras

A exposição, A OLIVEIRA E A PALAVRA, a propósito de José Saramago assume-se como uma perspetiva da vida e obra de José Saramago onde a semiológica e a semiótica se encontram através das várias peças de arte criadas pela artista visual Saskia Moro.

Na exposição, Saskia Mora faz a ligação da arte visual com a literatura, o cruzamento entre a teoria literária e a prática artística uma vez que a arte se encontra dentro de um contexto cultural mais vasto e expansivo. A espacialidade da palavra e a temporalidade da pintura.

Colocadas na parede estão duas aguarelas, Oliveira- era este meu avô Jerónimo, pastor contador de histórias e Oliveira - sempre chegamos ao sítio que nos esperam, com pequenos textos, fragmentos dos livros de José Saramago.  Saskia Moro joga entre o banal e o simbólico na sua homenagem ao escritor.

As aguarelas colocadas dentro das gavetas representam paisagem da ilha de Lancelote, o local da morte de José Saramago. Também dentro das gavetas estão as caixas de Petri, composições realizadas com frases do escritor e pequenos objetos. “As imagens da intimidade que são solidárias das gavetas e dos cofres, solidárias de todos os esconderijos em que o homem, grande sonhador de fechaduras, encerra ou dissimula seus segredos.”[1] Este tipo de pinturas e objetos encontram-se entre o público e o privado, resguardadas e veladas parcialmente criam uma ambiência de cumplicidade entre a artista e o espectador.

A constante ligação entre a literatura e a arte ou entre a imagem e o texto corresponde ao conteúdo temático da exposição. A palavra como objeto, a palavra como poesia, a palavra como arte, a palavra como comunicação. Na lógica de expansão dos objetos pictóricos em todos os seus domínios, situa-se o trabalho de Saskia Moro. A exposição pretende ser um ciclo: nascimento /arte / palavra / amor / morte. “O amor e a morte. Os dois personagens principais desta história sem trama nem desfecho, mas que condensam a maior parte do som e da fúria da vida admitem, mais que quaisquer outros, esse tipo de devaneio/escrita/leitura.”[2] Esta consistência entre espaço real e irreal, a presença física dum espaço que muitas vezes evoca a transformação desse espaço durante um determinado tempo constrói a narrativa da exposição.

José Saramago nasceu na povoação de Azinhaga, terra de oliveiras, daí a importância da oliveira como símbolo da exposição. No centro da sala estão instaladas a escultura, Oliveira de José Saramago[3] feita em aço cortem que juntamente com a instalação construída com folhas da Oliveira que está plantada em frente da Fundação José Saramago e onde estão as suas cinzas do escritor, dão o mote à exposição.  Esta manipulação criativa e a sua racionalização protagonizam uma ideia de uma obra orgânica associada a ideias que são complementares, à poética da exposição e ao intuito que ela representa.  

Dentro da hotte está colocado o livro de artista, as palavras / las palavras, a capa e a contracapa são em vidro. Citando a artista,” em 2018, pensei em fazer um livro de artista, dentro de duas placas de vidro, coloquei ideias, palavras. A minha relação com os livros na minha biblioteca é muito intensa. Estive durante algum tempo a pensar que palavras eu poderia colocar e por acaso encontrei o livro As palavras de José Saramago. Foi uma causalidade.”

Para a artista o livro é a essência da palavra e para ser um livro, cumprir o seu desígnio terá que ser um contentor de palavras, mas nem todas as palavras fazem um livro. “É que agora sinto necessidade de palavras e é novo para mim o que escrevo porque minha verdadeira palavra foi até agora intocada. A palavra é a minha quarta dimensão.”[4] O Laboratório de Química Analítica é agora um contentor de palavras, palavras escritas, palavras pintadas, palavras oliveira, palavras silêncio…

 

“Recorda-te, Jesus, no Horto da Oliveiras,
Oravas, ajoelhado e humilde, os olhos cavos,
Àquele que no céu sorria ao soar dos cravos
Que te enterravam carne adentro mãos grosseiras.” [5]

 

[1] Gaston Bachelard, in: A Poética do Espaço, p.62.

[2] Zygmunt Bauman, in: Amor líquido – Sobre a Fragilidade dos laços humanos, p. 15.

[3] A Fundação José Saramago vende na sua loja, múltiplos desta escultura em tamanho pequeno. “Criação de Saskia Moro, por ocasião do Centenário do nascimento do escritor. Inspirada na oliveira que acolhe as cinzas do escritor José Saramago. As oliveiras são símbolo da paz e da sabedoria. A frase final de Memorial do Convento, em forma de epitáfio, encerra o espaço que a cidade de Lisboa dedica ao escritor, diante da Fundação que leva o seu nome. ‘não subiu às estrelas, se à terra pertencia’”.  Informação retirada do site da fundação.

[4] Clarice Lispector, in: Água viva, p.

[5] Charles Baudelaire, in: As flores do mal, p.592.
 

Curadoria: Sofia Marçal

Inauguração: 19 janeiro, 18h00 às 20h00