Passar para o conteúdo principal
Exposição de Arte e Ciência

Data

14 Setembro - 29 Outubro 2023

Local

Museu

Exposição do artista plástico Javier Artero

 

Reviver o futuro 

O Museu Nacional de História Natural e da Ciência pertence à Universidade de Lisboa, e com esse prossuposto realiza-se a exposição do artista visual Javier Artero, uma vez que se pretende estabelecer um diálogo entre o acervo do museu e o acervo do Centro de Instrumentação Científica da Universidade de Granada (UGR), Universidade onde o artista desenvolveu as suas pesquisas mais recentes.

Exposição A sala dos viajantes apresenta-se numa sala inesperada do museu, uma sala técnica, a sala de multimédia. Opção intencional dado o caracter da exposição, onde a valorização entre a Arte e a Ciência se apresenta de uma forma ténue, mas convicta. A exposição de Javier Artero insere-se num projeto que levita à volta da suspensão narrativa no contexto do género cinematográfico de viagem espacial no âmbito da ficção científica. Lembrando o filme Solaris de Andrei Tarkovski,[1] no qual a película não editada transcreve o tempo em tempo real. Tarkovski utiliza planos longos e poucos cortes nos filmes, com a intenção de criar a sensação de passagem do tempo. Aqui no museu a intenção do artista é promover uma aproximação entre o público e os acervos do museu a partir da linguagem cinematográfica e da arte contemporânea.

A narrativa estética que se desenvolve na exposição representa uma intenção deliberadamente virtual no campo do pragmatismo estético,  “como pode a arte falar a linguagem de uma experiência radicalmente diferente, como pode ela representar a diferença qualitativa?”[2] questões levantadas por Herbert Marcuse e que podem em parte ser respondidas nesta exposição. Uma vez captada a atenção do espectador, é possível contemplar os diferentes acervos museológicos através do olhar da ficção e da imaginação. 

Os objetos expostos das duas universidades, a maquinaria científica obsoleta, assim como as imagens microscópicas são de períodos históricos semelhantes e como nos diz Javier Artero, “este diálogo fala-nos da evolução da ciência e da tecnologia em Portugal e Espanha. Onde se propõe uma visão artística da ciência através de estratégias de camuflagem.” Como é o caso do vinil utilizado nas janelas, imagens da coleção científica da Universidade de Granada, que nos sugerem paisagens extraterrestres no exterior da sala.

A exposição é composta por três instrumentos da coleção científica do museu, dois microscópios eletrónicos de varrimento (SEM) oriundos de centros científicos destintos.[3] E de imagens da coleção dos instrumentos científicos da Universidade de Granada, diapositivos de células, tecidos, utilizados nas aulas da Faculdade de Medicina. Podem ser visualizadas no ecrã e que tentam recriar paisagens extraterrestres, paisagens espaciais. 

A intenção da exposição é reconstruir uma ficção científica sobre uma suposta viagem espacial numa missão pedagógica. O vinil que está colocado nas janelas também ajuda a criar a tonalidade do ambiente pretendido, como se estivéssemos numa cápsula do tempo. A Sala dos viajantes faz referência a uma imaginada viagem que aconteceu há algum tempo e das quais se retiraram imagens que se podem visualizar nos ecrãs.  Uma referência à literatura científica, por exemplo ao livro do escritor Arthur C. Clarke, 2001: Uma Odisseia no Espaço, livro que veio a ser adaptado ao cinema por Stanley Kubrick em 1968. O filme é  de um grande realismo científico para a época, precursor em efeitos especiais, com imagens ambíguas, por vezes surrealistas. É interessante fantasiar à volta da ideia de viagens espaciais, a colonização de outros planetas e a influência que seres extraterrestres tiveram na evolução da espécie humana e no nosso planeta.

Com a exposição Sala dos viajantes, propõe-se não só uma aproximação às coleções científicas das duas universidades, mas também segundo Javier Artero,  sensibilizar o público para o momento em que estamos a viver e da nossa perceção que o futuro longínquo projetado no cinema de ficção científica,  se torna cada vez mais uma realidade próxima, com a escassez de recursos, as mudanças climáticas e as guerras.

“A convicção de que tudo o que acontece no mundo deve ser compreensível, pode nos levar a interpretar a história a través de lugares-comuns. Compreender não significa negar os fatos, o chocante, eliminar o inaudito, ou ao explicarem-se os fenómenos, utilizarem-se analogias que na sua generalidade diminuem o impacto da realidade e o choque da experiência. Significa, antes de mais nada, examinar e suportar conscientemente o fardo que o nosso século colocou sobre nós sem negar a sua existência, nem vergar humildemente ao seu peso. Compreender significa, em suma, encarar a realidade sem preconceitos e com atenção, e resistir a ela qualquer que seja.”[4]

 

Sofia Marçal

 

[1] Filme de 1972, do cineasta russo Andrei Tarkovski (1932-1986). Tarkovsky, autor da teoria de cinema, esculpir no tempo, o realizador pretende transmitir a nossa experiência de tempo e alterá-lo.

[2] Herbert Marcuse, in: A dimensão estética, p.43. 

[3] Um proveniente do Centro de zoologia do Instituto de Investigação Científica Tropical, outro do Instituto Bacteriológico Câmara Pestana. Estes aparelhos são microscópios eletrónicos capazes de produzir imagens de alta resolução da superfície de uma amostra.  Estes objetos estão em estudo.

[4] Hannah Arendt, In: Origens do totalitarismo, p.7.

 

Curadoria: Sofia Marçal
 

Inauguração: 13 de setembro, 18h00