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Os sonhos não têm título1
A realizadora Pocas Pascoal2 , começou a trabalhar como câmara-Woman na Televisão Pública de Angola. Frequentou o curso do Conservatoire National du Cinéma Français. Dedicou-se à fotografia e realizou diversos documentários e curtas-metragens. Fez várias exposições de fotografias, onde obteve prémios. Atualmente o seu trabalha artístico incide sobre as alterações climáticas, o aquecimento global e a seca prolongada, entre outros temas de caracter ambientalista e social. A artista expõe as suas convicções ativistas através da sua arte, revelando uma prática paradigmática critica. As imagens que compõem os vídeos são o seu poder e a sua força ideológica.
Na Exposição Time to Change, Pocas Pascoal presenta pela primeira vez vídeo-instalações. A exposição é composta por 2 vídeo-instalações, sem título e um documentário. Obras com um grande caracter sensorial, de extensão espacial e com duração temporal. O processo artístico de Pocas Pascoal é apelativo com um forte impulso dominante de práticas orientadas para um público diversificado e abrangente.
O 1º vídeo-instalação, é um vídeo duplo, emocionalmente forte, onde os elementos de solidão, de tristeza, de dor, de raiva, de luto, nos alertam para a nossa consciência coletiva, juntamente com o desejo de autoconsciência de Pocas Pascoal e sensibilização para a devação sublime. “Portanto, a superioridade física do homem sobre as forças da natureza não é uma causa do sublime, porque quase sempre onde se encontra diminui a sublimidade do objeto ou o destrói completamente. É verdade que podemos parar com considerável prazer na contemplação da habilidade humana que soube subjugar as mais selvagens forças naturais, mas a fonte desse prazer é lógica e não estética, é um efeito do pensamento, não instigado pela representação.”3
Caminhos que outrora eram caminhados, hoje já não levam a lado nenhum no silêncio dessa floresta perdida. Espaço que quase ficou estéril, mas tal como no quadro Guernica de Picasso, há esperança, aí representada pela pomba branca, agora pela echarpe branca e pela casca de algumas árvores que ainda têm vitalidade.
Já no 2º vídeo-instalação, Pocas Pascoal pretende fazer uma ponte entre o tempo passado, com imagens do arquivo fotográfico do museu e a contemporaneidade, dado que a destruição do ecossistema já existia com a caça grossa e com a exploração da terra pelo Homem. “A denúncia não se esgota em si mesma no reconhecimento do mal: a arte é também a promessa da libertação. Esta promessa é, também, uma qualidade da forma estética ou, mais precisamente, do belo como uma qualidade da forma estética. A promessa é arrancada da realidade estabelecida. Conjura a dominação do poder, a aparência da libertação. Mas só a aparência: naturalmente, a realização desta promessa não está dentro das possibilidades da arte.”4 As imagens que compõem o vídeo, evocam o colonialismo e o capitalismo, e o seu impacto na biodiversidade local e global.
O documentário Sopro, é sobre um casal holandês Marion e Peter, que perdeu a sua quinta no incêndio de Pedrógão Grande no verão de 2017, e das cinzas reconstroem de novo a sua vida. Filme premiado no Festival de Cinema IndieLisboa, com o Prémio Árvore da Vida para Filme Português em 2021.
Segundo Pocas Pascoal, “esta exposição tem por objetivo convocar o público para uma reflexão profunda sobre a proteção do planeta, cuja urgência se torna cada vez mais incontornável. “A morte, a vinda da morte até nós, também é essa recordação. É como o presente. Está inteiramente ali, como a memória do que aconteceu, como a memória do que vai acontecer, a primavera dos anos passados, acumulados, e daquilo que acontece, uma folha de cada vez, e está quase ali, connosco.”5 Pocas Pascoal preocupa-se em integrar a arte num âmbito social, não deixando para segundo plano as suas preocupações estéticas em sintonia com o seu posicionamento artístico / político. É sempre um desafio entusiasmante idealizar-se que através da arte se pode consciencializar o público para os problemas ambientais, sociais, económicos e políticos, na esperança de se contribuir para uma sociedade melhor.
Sofia Marçal
[1] Título do pavilhão de França na Bienal de Veneza 2022, no original, Dreams have no titles.
[2] Pocas Pascoal nasceu em Luanda em 1963. Veio para Portugal aos 16 anos, quando se intensificou a guerra civil em Angola e passado um ano voltou para o seu pais mas foi em França que se radicou. Em 2002, fez parte do grupo de artistas da Cité Internationale des Arts e participou em diversas exposições de arte contemporânea. Em 1998 fez seu primeiro curta de ficção Pour Nous; depois realizou Memórias de Infância (2000); Há sempre alguém que te ama (2003), que foi desenvolvido numa residência em Lussas, premiado pela SCAM (Société Civile des Auteurs Multimedia) e selecionado em diversos festivais; Amanhã será diferente (2009); Alda e Maria - Por Aqui Tudo Bem (2011) e A Palavra Magica e Sopro em 2021.
[3]Friedrich Schiller, in: O sublime, p.43.
[4] Herbert Marcuse, in: A dimensão estética, p.47.
[5] Marguerite Duras, in: A vida material, p.76.
Inauguração: 16 dezembro, às 18h00